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O papel da mola no canivete suíço

Conforme o que até agora já comentamos a respeito das inovações trazidas por Karl Elsener, cuteleiro que desenvolveu a faca original do exército Suíço, uma das invenções mais brilhantes por parte dele foi a mola de segurança deste novo canivete.

Mas do que se trata e donde vem sua eficiência?

É necessário, primeiramente, sabermos como eram e como se comportavam anteriormente as molas de canivetes para podermos compreender melhor a originalidade desta nova invenção; até porque esta é um dos pontos mais críticos na fabricação de um canivete, tornando-o até inutilizável caso falhe. Saiba que uma mola de canivete de qualidade duvidosa pode colocar sua vida em risco: se você levar no bolso o apetrecho e ele não fechar corretamente devido ao defeito, a lâmina pode agarrar no tecido de sua calça e se abrir, podendo provocar ferimentos graves. Por isso, qualquer canivete minimamente decente tem de ter uma boa mola.

Quando analisamos a mola clássica, que fica presa em dois pontos, da metade do canivete até sua extremidade oposta à ferramenta, percebemos que ela exerce a pressão sobre a base de sua respectiva ferramenta aproveitando o ponto central, quando presa por um rebite. Dependendo do recuo da base da ferramenta, da distância dos rebites que prendem todas as peças e da composição metálica da mola, a pressão exercida por ela sobre a ferramenta pode ser bastante grande, aumentando o esforço na abertura e fechadura da mesma, que via de regra, dobra para dentro do canivete. Porém, até Elsener repensar seu formato, ela não passava de mais um componente comum na estrutura da faca dobrável e ainda não tinha sido explorada em todo seu potencial.

O tamanho dos canivetes e seu peso é algo crítico para quem o leva no bolso: se grande demais, atrapalha o andar do indivíduo; se pequeno demais, desaparece no bolso e até pode ser perder com extrema facilidade. Por outro lado, se grande demais também faz um volume gigantesco no bolso e, pelo seu peso, pode até rompê-lo com o passar do tempo, enquanto que, se pequeno demais, não poderá carregar muita funcionalidade e resistir aos desafios do quotidiano. A mola entra nessa análise como uma chave crucial, pois até o começo do século XX o potencial do canivete só podia ser aproveitado pela metade, devido ao uso comum desta mola única por fileira de ferramentas. Os canivetes, em geral, apenas carregavam lâminas e outras poucas ferramentas que podiam ser agregadas ao jogo estrutural sem onerar o objeto em peso, preço e dimensão. Os punções dominavam as ferramentas deste período – eram vazadores ou perfuradores para couro e madeira, muito necessário numa época em que o plástico pouco era utilizado.

A proposta de Elsener foi simples e funcional: utilizar dois rebites ao centro do canivete para apoiar a mola (que passou a ser moldada da seguinte forma: └┐) e ela desempenhar a mesma função nas duas extremidades, além da possibilidade mais tarde explorada de uso de uma terceira ferramenta ao centro com o deslocamento do mesmo para mais próximo de uma das extremidades. Não era apenas criar mais um jogo de ferramentas onde antes cabia um, mas criar mais dois jogos sem perda de eficiência. Isso aumentou drasticamente as possibilidades de uso de um canivete, quando então os mais diversos objetos puderam ser miniaturizados e transformados em componentes de auxilio para profissionais, caso que se deu com os militares suíços, que ganharam uma chave de fenda, um abridor de garrafas, um abridor de latas e um punção além da lâmina de corte clássica.

Se para você pode parecer óbvia e sem graça a invenção, pense que ela representou um salto de aperfeiçoamento gigantesco das lâminas portáteis e das ferramentas militares carregadas pelos soldados. Esse era o contexto anterior à Primeira Guerra Mundial. Além disso, Elsener não parou na invenção, aperfeiçoando a qualidade que, enfim, dava segurança, confiabilidade e longevidade à ferramenta, tornando-a própria para situações de estresse extremo no uso diário. Prova é a adoção do aço inoxidável e das talas em plástico pvc, que uniram durabilidade e leveza a um produto que não sofria grandes upgrades há décadas.

Outra prova cabal da originalidade da invenção é a seguinte: concorrentes tentaram, seja por vias legais ou ilegais, imitar o invento tal qual o conhecemos hoje e não o conseguiram. Apenas uma ou outra fabricante suíça conseguiu o feito de assemelhar seus produtos ao SAK, mesmo assim somente apenas depois de tentativas inúmeras.

É por estes e outros fatos que a Victorinox é símbolo de canivete no mundo há mais de um século e assim permanecerá seguindo os princípios de perspicácia e empenho do seu fundador.

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Karl Elsener (1860-1918) Ibach é uma pequena cidade Suíça famosa por suas paisagens encantadoras, pelas suas casas de arquitetura teutônica muito particular e pela presença forte de um exército de cuteleiros que fizeram fama internacional a partir da ideia originalíssima de um perspicaz profissional chamado Karl Elsener. Nascido na década de 1860, Elsener completou seu aprendizado de cutelaria na cidade de Zug, especialmente se dedicando ao fabrico de facas. Era um trabalho modesto numa época em que a Suíça apenas possuía uma história de resistência à sua incorporação pelas nações vizinhas da Itália, Prússia e França, cuja economia era muito pouco sofisticada e não apresentava os altos índices de desenvolvimento hoje alcançados. Em geral, o país era considerado no alvorecer do século XX como um dos mais pobres da Europa. Pela tamanho diminuto do seu território, pela ausência de riquezas minerais e/ou vegetais, pelo clima em algumas partes rigoroso durante quase todo o ano, re